"SOMOS PERSEVERANTES"

Mário Neto Borges, presidente da Fapemig
Cíntia Melo – cintia@souecologico.com

Edição 36 - Publicado em: 30/11/-0001

O pre­si­den­te da Fun­da­ção de Am­pa­ro à Pes­qui­sa do Es­ta­do de Mi­nas Ge­rais (Fa­pe­mig), Má­rio Ne­to Bor­ges, in­gres­sou na ins­ti­tui­ção em 2004 co­mo di­re­tor-cien­tí­fi­co quan­do a rees­tru­tu­rou crian­do no­vas ge­rên­cias e de­par­ta­men­tos.
En­ge­nhei­ro ele­tri­cis­ta pe­la PUC-MG (1978), ele é mes­tre em Acio­na­men­tos Elé­tri­cos pe­la UFMG (1985) e dou­tor em In­te­li­gên­cia Ar­ti­fi­cial Apli­ca­da à Edu­ca­ção pe­la Uni­ver­si­da­de de Hu­d­der­s­field, na In­gla­ter­ra (1994).
Além de pes­qui­sa­dor e pro­fes­sor da PUC-Mi­nas e UFMG, tam­bém já foi rei­tor da Uni­ver­si­da­de Fe­de­ral de São João Del-Rei (1998 a 2004). "Tra­ba­lhei em di­fe­ren­tes fren­tes na área da pes­qui­sa e edu­ca­ção e sem­pre apos­tei na va­lo­ri­za­ção da ciên­cia, tec­no­lo­gia e ino­va­ção co­mo ve­tor de de­sen­vol­vi­men­to so­cial, eco­nô­mi­co e sus­ten­tá­vel".
Con­fi­ra, a se­guir, a en­tre­vis­ta do pro­fes­sor Má­rio Ne­to Bor­ges à Re­vis­ta ECO­LÓ­GI­CO, que irá inau­gu­rar uma par­ce­ria pa­ra di­vul­ga­ção de con­teú­do cien­tí­fi­co com a Fun­da­ção, a par­tir da nossa edi­ção de outubro:

Qual o pa­pel da Fa­pe­mig no fo­men­to da pes­qui­sa cien­tí­fi­ca e tec­no­ló­gi­ca pa­ra a so­lu­ção dos pro­ble­mas am­bien­tais?
Nos­sa fun­ção é ge­rar qua­li­da­de de vi­da, ri­que­za e co­nhe­ci­men­to a par­tir da ciên­cia, tec­no­lo­gia e ino­va­ção. A úni­ca ma­nei­ra de re­sol­ver­mos a equa­ção do uso dos re­cur­sos e do cui­da­do com o pla­ne­ta é in­ves­tin­do na pes­qui­sa des­ses te­mas. Es­se é um de­ver que le­va­mos a sé­rio na Fun­da­ção. Tan­to que, ano pas­sa­do, apro­va­mos 21 pro­je­tos li­ga­dos ao meio am­bien­te, com in­ves­ti­men­tos de R$ 3,1 bi­lhões.

É pos­sí­vel de­sen­vol­ver e pre­ser­var?
Sim. Não po­de­mos dei­xar que o dis­cur­so de am­bien­ta­lis­tas ra­di­cais, que têm luz elé­tri­ca e co­mi­da na me­sa, e que­rem pre­ser­var o meio am­bien­te a qual­quer cus­to, im­pe­ça que ca­ma­das mais ca­ren­tes da po­pu­la­ção te­nham aces­so a in­fraes­tru­tu­ra bá­si­ca. O ho­mem pre­ci­sa de ali­men­to e ener­gia e es­se con­su­mo ten­de a se am­pliar. O que se ex­pli­ca pe­lo au­men­to da po­pu­la­ção e tam­bém pe­lo di­rei­to dos mais ca­ren­tes a uma vi­da me­lhor.

A bus­ca da me­lho­ria da qua­li­da­de de vi­da é ine­vi­tá­vel?
Exa­ta­men­te. E a ciên­cia é res­pon­sá­vel por is­so, aju­dan­do a en­con­trar so­lu­ções cien­tí­fi­cas e tec­no­ló­gi­cas que ga­ran­tam a pro­du­ção de ali­men­tos, de ener­gia e do equi­lí­brio do de­sen­vol­vi­men­to sus­ten­tá­vel a par­tir de uma abor­da­gem sé­ria, isen­ta de ideo­lo­gias e ra­di­ca­lis­mos. Por exem­plo: exis­te um de­ba­te in­ten­so so­bre o uso dos com­bus­tí­veis fós­seis, mas nós ain­da va­mos uti­li­zá-los por mui­to tem­po. Só que já exis­tem al­ter­na­ti­vas e so­lu­ções pa­ra que es­se des­gas­te am­bien­tal se­ja mi­ni­mi­za­do. O ál­cool e o car­ro elé­tri­co são duas al­ter­na­ti­vas. Exis­tem ou­tras. En­con­trar o cus­to-be­ne­fí­cio des­sas so­lu­ções é que irá ga­ran­tir uma vi­da me­lhor no pla­ne­ta.

O se­nhor é a fa­vor da ex­plo­ra­ção do pré-sal?
Sim, por­que o Bra­sil de­pen­de des­sa ri­que­za pa­ra me­lho­rar seu equi­lí­brio so­cial. Mas es­pe­ra­mos que par­te dos re­cur­sos ad­vin­dos do pré-sal se des­ti­ne à edu­ca­ção, ciên­cia, tec­no­lo­gia e ino­va­ção, fo­men­tan­do es­tu­dos que di­mi­nuam seus im­pac­tos.

Co­mo é o pro­ces­so de ins­cri­ção e ava­lia­ção de pro­je­tos na Fa­pe­mig?
Lan­ça­mos edi­tais com os tó­pi­cos que que­re­mos que se­jam pes­qui­sa­dos: re­sí­duos só­li­dos, água, etc. A par­tir daí, pes­qui­sa­do­res e cen­tros de pes­qui­sas pú­bli­cos e pri­va­dos sub­me­tem seus pro­je­tos. Nos­so co­mi­tê jul­ga­dor, com­pos­to por es­pe­cia­lis­tas de di­ver­sas áreas, jun­ta­men­te com a Fun­da­ção Es­ta­dual do Meio Am­bien­te (Feam), ava­lia as pro­pos­tas. As me­lho­res são con­tra­ta­das e têm um pra­zo mí­ni­mo de dois anos pa­ra es­tu­dar o as­sun­to e apre­sen­tar so­lu­ções. Se o pro­je­to é téc­ni­ca e eco­no­mi­ca­men­te viá­vel, con­ti­nua­mos in­ves­tin­do em seu apro­fun­da­men­to, pro­te­ção in­te­lec­tual e pa­ten­te.

Po­de dar um exem­plo?
Sim. A UFMG e o De­par­ta­men­to de Es­tra­das de Ro­da­gem (DER) es­tu­da­ram uma so­lu­ção pa­ra o apro­vei­ta­men­to de pneus. No pro­je­to, eles eram moí­dos e mis­tu­ra­dos à mas­sa as­fál­ti­ca, re­du­zin­do a quan­ti­da­de de pe­tró­leo usa­do pa­ra as­fal­tar ruas, es­tra­das e ave­ni­das. Aqui em Be­lo Ho­ri­zon­te es­se pro­je­to foi apli­ca­do na "Li­nha Ver­de". Es­se ti­po de as­fal­to tem mais qua­li­da­de de­vi­do à elas­ti­ci­da­de e du­ra­bi­li­da­de do pneu.

O ser hu­ma­no aca­ba so­lu­cio­nan­do os pro­ble­mas que cria?
Sim. As res­pos­tas, mes­mo que não tão rá­pi­das quan­to o ne­ces­sá­rio, sem­pre sur­gem quan­do há de­man­da. A es­cas­sez de pe­tró­leo, por exemplo, fez sur­gir o abas­te­ci­men­to a ál­cool. O Bra­sil era um pe­que­no pro­du­tor de so­ja no Rio Gran­de do Sul até o dia em que a Em­bra­pa, a Epa­mig (Em­pre­sa de Pes­qui­sa Agro­pe­cuá­ria de Mi­nas Ge­rais) e a Uni­ver­si­da­de Fe­de­ral de Vi­ço­sa de­sen­vol­ve­ram a so­ja do Cer­ra­do, co­lo­can­do o país no ranking de maior pro­du­tor do mun­do.

De on­de vem e quan­to é o or­ça­men­to da Fa­pe­mig?
A fon­te prin­ci­pal de re­cur­sos vem do Es­ta­do e re­pre­sen­ta um por cen­to de sua re­cei­ta lí­qui­da cor­ren­te. Es­se per­cen­tual foi hon­ra­do pe­la pri­mei­ra vez pe­lo Go­ver­na­dor Aé­cio Ne­ves, em 2006. E até ho­je o com­pro­mis­so tem si­do man­ti­do. Par­te des­se re­cur­so é usa­da pa­ra atrair re­cur­sos de ou­tras fon­tes, a par­tir de par­ce­rias com o Go­ver­no Fe­de­ral e ór­gãos in­ter­na­cio­nais. Já trou­xe­mos re­cur­sos da Ale­ma­nha, Itá­lia, Fran­ça, Es­ta­dos Uni­dos e de em­pre­sas. Ano pas­sa­do in­ves­ti­mos R$ 233 mi­lhões do nos­so um por cen­to e ou­tros R$ 51 mi­lhões de par­ce­rias.

Qual o re­tra­to das ins­ti­tui­ções de pes­qui­sa no Bra­sil ho­je?
Se com­pa­rar­mos com o ce­ná­rio in­ter­na­cio­nal ain­da não te­mos o su­fi­cien­te, mas já avan­ça­mos bas­tan­te. Não há tan­ta eva­são de pes­qui­sa­do­res pa­ra o ex­te­rior co­mo an­tes. Há ho­je 25 Fun­da­ções Es­ta­duais de Am­pa­ro à Pes­qui­sa (Fap's) (fal­tam ain­da Ron­dô­nia e Ro­rai­ma) com or­ça­men­to maior que o do CNPQ (Con­se­lho Na­cio­nal de De­sen­vol­vi­men­to Cien­tí­fi­co e Tec­no­ló­gi­co).

As FAPs tra­ba­lham em con­jun­to?
Sim. Te­mos uma re­de. Rio de Ja­nei­ro, Mi­nas Ge­rais e Ama­zô­nia, por exem­plo, es­tão tra­ba­lhan­do com a tu­ber­cu­lo­se. Exis­tem ou­tras pes­qui­sas em re­de fo­ca­das na ma­lá­ria e na den­gue. Va­le res­sal­tar que a gran­de maio­ria das fun­da­ções tem me­nos de 10 anos, já que a pes­qui­sa no Bra­sil co­me­çou a se in­ten­si­fi­car em 1999, no Go­ver­no FHC, com a cria­ção dos Fun­dos Se­to­riais de Ciên­cia e Tec­no­lo­gia, que pas­sa­ram a re­co­lher per­cen­tuais da ar­re­ca­da­ção de im­pos­tos de suas re­cei­tas. E tam­bém a con­tri­buir com o Fun­do Na­cio­nal de De­sen­vol­vi­men­to Cien­tí­fi­co e Tec­no­ló­gi­co do país.

A cria­ti­vi­da­de na­ta do bra­si­lei­ro aju­da no tra­ba­lho com pes­qui­sa?
Sim, mas é pre­ci­so tam­bém uma boa for­ma­ção. Por is­so há ne­ces­si­da­de de se me­lho­rar a edu­ca­ção bá­si­ca no Bra­sil. Na fal­ta de en­ge­nhei­ros no mer­ca­do, não adian­ta abrir­mos mais va­gas nas uni­ver­si­da­des se lá no En­si­no Fun­da­men­tal as crian­ças não es­tão apren­den­do bem Fí­si­ca e Ma­te­má­ti­ca.

O que fal­ta pa­ra pro­vo­car o ta­len­to de pes­qui­sa­dor dos es­tu­dan­tes bra­si­lei­ros?
Fa­zer com que a ciên­cia, a tec­no­lo­gia e a ino­va­ção se­jam va­lo­ri­za­das é um tra­ba­lho de água mo­le em pe­dra du­ra. Mas é pos­sí­vel. É pre­ci­so es­ti­mu­lar e apoiar os alu­nos pa­ra des­co­brir ta­len­tos den­tro da sa­la de au­la e criar gran­des cien­tis­tas. Em nos­so pro­gra­ma "Ini­cia­ção Cien­tí­fi­ca Jú­nior" com alu­nos do En­si­no Mé­dio, for­ne­ce­mos bol­sa pa­ra 1.400 jo­vens da es­co­la pú­bli­ca. Uma es­tu­dan­te (Jú­lia Soa­res Par­rei­ras) do CE­FET-MG (Cen­tro Fe­de­ral de Edu­ca­ção Tec­no­ló­gi­ca de Mi­nas Ge­rais) ga­nhou o prê­mio “Jo­vem Cien­tis­ta de 2008” com um pro­je­to de me­lho­ria da qua­li­da­de da água em co­mu­ni­da­des ca­ren­tes que pa­tro­ci­na­mos.

A ciên­cia, a tec­no­lo­gia e a ino­va­ção não são mui­to va­lo­ri­za­das no Bra­sil?
A so­cie­da­de não con­si­de­ra a ciên­cia co­mo um va­lor. Pre­fe­re dis­cu­tir fu­te­bol, de­sas­tres e po­lí­ti­ca sem as­so­ciar ao seu dia a dia as di­ver­sas tec­no­lo­gias que fa­zem par­te de­le. E lhes per­mi­te as­sis­tir a uma par­ti­da de fu­te­bol, ou, a uti­li­zar o ce­lu­lar. À me­di­da que a cul­tu­ra da so­cie­da­de bra­si­lei­ra au­men­tar, es­sa cons­ciên­cia se am­plia. So­mos per­se­ve­ran­tes na po­pu­la­ri­za­ção do te­ma atra­vés da Se­ma­na Na­cio­nal de Ciên­cia e Tec­no­lo­gia, com os Mu­seus In­te­ra­ti­vos de Ciên­cias, a cria­ção da Rá­dio e da TV Fa­pe­mig, bo­le­tins men­sais, re­vis­ta e tam­bém com a re­vi­ta­li­za­ção de nos­so por­tal.

A Fa­pe­mig es­tá com­ple­tan­do 25 anos. O que co­me­mo­rar e o que es­pe­rar dos pró­xi­mos 25?
A Fun­da­ção se­rá ca­da vez mais um ve­tor de de­sen­vol­vi­men­to so­cial e eco­nô­mi­co, ace­le­ran­do, me­lho­ran­do e qua­li­fi­can­do o de­sen­vol­vi­men­to do Es­ta­do. Além dis­so, uma no­va se­de es­tá sen­do cons­truí­da a par­tir de um pro­je­to am­bien­tal in­te­li­gen­te, que uti­li­za luz na­tu­ral nos am­bien­tes, re­duz o con­su­mo de ener­gia no uso do ar con­di­cio­na­do e rea­pro­vei­ta a água. Es­se vai ser o pré­dio mais mo­der­no e in­te­li­gen­te de Be­lo Ho­ri­zon­te.

Que re­ca­do dei­xa­ria aos  lei­to­res?
Se a so­cie­da­de va­lo­ri­zar a ciên­cia, a tec­no­lo­gia e a ino­va­ção, os po­lí­ti­cos tam­bém o fa­rão, já que tra­ba­lham de acor­do com a pres­são que a so­cie­da­de exer­ce. Nes­se ca­so, po­de­re­mos ga­ran­tir re­cur­sos pa­ra man­ter o ci­clo po­si­ti­vo de pes­qui­sa, de­sen­vol­vi­men­to tec­no­ló­gi­co, trans­fe­rên­cia de tec­no­lo­gia na cria­ção de pro­du­tos que me­lho­rem a qua­li­da­de de vi­da das pes­soas, ge­ra­ção de ri­que­za, de em­pre­gos e re­cur­sos ad­vin­dos de im­pos­tos que re­tor­nam pa­ra a má­qui­na do Es­ta­do.

(*) A par­tir da pró­xi­ma edi­ção, a Re­vis­ta ECO­LÓ­GI­CO pu­bli­ca­rá ar­ti­gos pro­du­zi­dos       pe­la Fa­pe­mig na se­ção "Olhar Científico".

Saiba mais:
A no­va se­de da Fa­pe­mig se­rá cons­truí­da na Ave­ni­da Jo­sé Cân­di­do da Sil­vei­ra, no bair­ro Ci­da­de No­va, e con­ta­rá com cin­co blo­cos de qua­tro an­da­res. O com­ple­xo in­clui tam­bém a cons­tru­ção de um cen­tro de con­ven­ções com ca­pa­ci­da­de pa­ra 1,2 mil pes­soas. A obra, fi­nan­cia­da com re­cur­sos pró­prios da Fun­da­ção es­tá es­ti­ma­da em R$ 48.015.822,01. Pre­vis­ta pa­ra co­me­çar ain­da es­te ano, seu cro­no­gra­ma fí­si­co de exe­cu­ção tem pre­vi­são de 14 me­ses.


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