O mineiro de Conceição de Mato Dentro José Renato Resende andou por muitos lugares do Brasil nos anos em que trabalhou, seja na construção de barragens seja na indústria da moda. Mas foi quando se aposentou que seu ofício rendeu, literalmente, frutos. Ou melhor: frutos, flores e pássaros, espalhados por cada canto deste país.
Tudo começou em Guaraqueçaba, cidade do litoral do Paraná, ladeada por uma área de Mata Atlântica ainda preservada. Lá, Resende viu uma cena curiosa: índios jogavam pequenas frutinhas alaranjadas na água para atrair peixes. Logo, resolveu perguntar que espécie vegetal dava aquelas frutas e levou uma muda para seu sítio em Alvorada de Minas, região central do estado, para também alimentar seu cardume.
Passados alguns meses, a pequena árvore começou a dar frutos. Como num passe de mágica, o sítio, rodeado por uma carvoaria e carente de pássaros, se viu invadido por sabiás. Todos ficavam em volta da tal arvorezinha. Entusiasmado com a aparição dos “novos vizinhos”, José Renato decidiu comercializar as mudas pela região e espalhar a “passarada”.
Um dia, porém, foi surpreendido por uma fiscalização do Ibama. Na ocasião, a planta que ainda continuava sem nome foi levada pelo órgão para análise. Uma semana depois, o biólogo da instituição retornou não só com as informações técnicas, mas com elogios à iniciativa de Resende de comercializar a espécie.
Tratava-se da Acnistus Arborescens, popularmente conhecida como fruta-de-sabiá. Uma planta quase em extinção e considerada pioneira, por ser ideal para reflorestamento de áreas degradadas. Além de também ser um chamariz para pássaros, como o próprio nome diz. Em questão de oito meses ela produz pequenos frutos apreciados por sabiás, tico-ticos-rei, saíras, tiês, sanhaços, gaturamos, juritis, chocões-barrados, tucanos, bem-te-vis, entre outros. Era o incentivo que José Renato precisava para distribuir, sem receio, a espécie.
Seis anos se passaram. José Renato estima que mais de 100 mil mudas e 50 mil sementes foram comercializadas. Sendo que os maiores clientes são dos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília. Fregueses que, segundo ele, o deixaram “bilionário em agradecimentos e parabenizações”. Brincadeira que se confirma nos comentários deixados na rede social do projeto, onde os seguidores escrevem como a fruta-de-sabiá vem alterando positivamente a biodiversidade local.
José Renato Resende: “Quando plantei a primeira muda, os pássaros invadiram minha propriedade!”
Defensor entusiasta do cultivo da planta, José Renato conta que atualmente tem duas mil mudas no seu sítio de 97 hectares. Resultado de anos de muito sonho. Ele diz que deseja se dedicar à venda da fruta-de-sabiá “pelo resto de sua vida”, e que se sente muito feliz com esse trabalho, já que “sabe que ajudar no plantio de árvores traz recompensações futuras”.
Depoimento ecológico
“Realmente, o cultivo da fruta-de-sabiá é uma forma muito positiva para que sítios, fazendas, e até mesmo os jardins das cidades atraiam não só o sabiá, mas pássaros como o bem-te-vi, sanhaços, gaturamos e mais dezenas de espécies de aves frugívoras. No litoral do Brasil é o principal atrativo do tiê-sangue, uma das aves mais belas encontradas no território nacional. Na década de 1960, ao lançar o LP ‘Cantos de Aves do Brasil’, tive apoio dos mais prestigiados jornalistas, radialistas e apresentadores de TV, pedindo que as pessoas na cidade de São Paulo plantassem nos seus jardins, pelo menos, um pé de pitangueira, amoreira e jabuticabeira. E o resultado foi que agora, cerca de mais de meio século depois, a metrópole de São Paulo se transformou na maior concentração de sabiás-laranjeiras do planeta. A introdução da fruta-de-sabiá em praças da cidade ajudou muito também.”
Johan Dalgas Frisch, ornitólogo e autor do livro “Aves Brasileiras”
Fique por dentro
A fruta-de-sabiá, também conhecida em outras regiões do Brasil como marianeira, é um arbusto com altura entre um e dois metros, mas que pode chegar até quatro. Tem galhos finos, madeira leve e pouco resistente. Destaca-se pela abundância de flores brancas em cachos, que logo se transformam em pequenas bagas alaranjadas. De fácil cultivo, aprecia solos organo-argilosos que retenham um pouco de umidade. Precisa de luz solar direta ou indireta para vegetar com vigor. Desenvolve-se bem em climas subtropicais e tropicais, podendo também ser cultivada em vasos. Inicia a frutificação em aproximadamente oito meses. A planta ainda alimenta dezenas de espécies de peixes, podendo ser cultivada em beiras de córregos.
Saiba mais
As sementes da fruta-de-sabiá podem ser adquiridas por meio do site www.frutadosabia.com.br e são enviadas em embalagens especiais via Correios, para qualquer lugar do país.